Usucapião Extrajudicial: Procedimentos e Eficácia
28 de set. de 2014
Usucapião Extrajudicial: Procedimentos e Eficácia
1. Introdução
A usucapião extrajudicial é um procedimento administrativo que permite o reconhecimento da propriedade de um imóvel sem a necessidade de ação judicial, desde que atendidos os requisitos legais. Regulamentada pelo Código de Processo Civil de 2015 e pela Lei nº 13.465/2017, essa modalidade visa desburocratizar e agilizar a regularização fundiária, contribuindo para a segurança jurídica e a valorização de imóveis informalmente ocupados.
O presente artigo abordará os requisitos, o procedimento e a eficácia da usucapião extrajudicial, destacando os desafios e benefícios dessa forma de aquisição da propriedade.
2. Fundamentos Jurídicos da Usucapião Extrajudicial
A usucapião é um meio de aquisição originária da propriedade, baseado na posse prolongada e no cumprimento dos requisitos legais. No Brasil, suas regras gerais estão previstas nos arts. 1.238 a 1.244 do Código Civil.
A modalidade extrajudicial foi introduzida pelo art. 216-A da Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/1973), incluído pelo Código de Processo Civil de 2015 e aprimorado pela Lei nº 13.465/2017. Essa norma possibilita que o interessado requeira o reconhecimento da propriedade diretamente ao cartório de registro de imóveis, sem a necessidade de uma ação judicial, caso não haja oposição de terceiros.
3. Requisitos para a Usucapião Extrajudicial
Para que a usucapião extrajudicial seja viável, o requerente deve demonstrar:
• Posse mansa, pacífica e ininterrupta sobre o imóvel.
• Decurso do prazo legal, conforme a modalidade de usucapião pretendida.
• Anima domini, ou seja, intenção de ser dono.
• Não oposição de terceiros (caso haja litígio, o procedimento será convertido em judicial).
• Atendimento às exigências específicas de cada modalidade de usucapião.
As modalidades mais comuns de usucapião aplicáveis ao procedimento extrajudicial incluem:
• Ordinária (art. 1.242, CC): 10 anos de posse, podendo ser reduzido para 5 anos se houver moradia ou realização de investimentos produtivos.
• Extraordinária (art. 1.238, CC): 15 anos de posse, reduzido para 10 anos em caso de residência ou realização de benfeitorias.
• Especial Urbana (art. 1.240, CC): 5 anos de posse, para imóveis de até 250m² utilizados como moradia.
• Especial Rural (art. 1.239, CC): 5 anos de posse, para áreas de até 50 hectares exploradas para subsistência.
4. Procedimento da Usucapião Extrajudicial
O pedido de usucapião extrajudicial é processado diretamente no cartório de registro de imóveis, conforme os seguintes passos:
4.1. Petição Inicial ao Cartório
O interessado, representado por advogado, deve apresentar um requerimento formal ao cartório da circunscrição do imóvel. A petição deve conter:
• Qualificação do requerente e dos possuidores anteriores (se houver).
• Descrição do imóvel e suas confrontações.
• Modalidade de usucapião pretendida.
4.2. Documentação Necessária
São exigidos os seguintes documentos:
1. Ata Notarial (lavrada em cartório de notas), atestando a posse e seu tempo.
2. Planta e memorial descritivo assinados por profissional habilitado e pelos confrontantes.
3. Certidões negativas de propriedade em nome do requerente.
4. Comprovantes de posse (IPTU, contas de consumo, declarações de vizinhos, etc.).
5. Declaração do requerente sobre a inexistência de ações judiciais envolvendo o imóvel.
4.3. Notificação de Interessados
O cartório notificará:
• Proprietário registral do imóvel.
• Confrontantes e terceiros interessados.
• Órgãos públicos, se o imóvel pertencer à União, Estado ou Município.
Se qualquer interessado contestar, o procedimento será encerrado e convertido em ação judicial.
4.4. Manifestação do Ministério Público
Caso haja indícios de irregularidade, o Ministério Público pode ser chamado a opinar sobre o pedido.
4.5. Registro da Usucapião
Se não houver impugnação, o oficial do cartório analisará o cumprimento dos requisitos e, se aprovados, registrará a aquisição da propriedade em nome do requerente.
5. Eficácia e Benefícios da Usucapião Extrajudicial
5.1. Segurança Jurídica
A regularização via usucapião extrajudicial garante segurança jurídica ao possuidor, permitindo que ele exerça plenamente os direitos de proprietário, incluindo a venda, financiamento e transmissão hereditária do imóvel.
5.2. Desburocratização e Agilidade
O procedimento extrajudicial é mais rápido e econômico do que a via judicial, evitando longos processos litigiosos. No entanto, sua eficácia depende da ausência de disputas e da colaboração dos interessados.
5.3. Impactos na Regularização Fundiária
A usucapião extrajudicial tem grande impacto na regularização de imóveis urbanos e rurais, especialmente em comunidades carentes, contribuindo para a inclusão social e o acesso ao crédito imobiliário.
6. Desafios e Limitações
Apesar de suas vantagens, a usucapião extrajudicial enfrenta desafios, como:
• Resistência de cartórios e exigências excessivas, que podem burocratizar o procedimento.
• Dificuldade na obtenção da anuência dos confrontantes, especialmente em áreas de conflito fundiário.
• Falta de conhecimento da população e de profissionais do direito, o que limita a utilização desse instrumento.
• Interpretações restritivas por parte de órgãos públicos, dificultando a regularização de imóveis em áreas urbanas.
7. Jurisprudência e Casos Relevantes
A jurisprudência tem reforçado a aplicabilidade da usucapião extrajudicial. Algumas decisões importantes incluem:
• TJSP – Apelação Cível 1007920-71.2021.8.26.0554: Reafirmou que a negativa infundada do cartório pode ser contestada judicialmente.
• STJ – REsp 1.667.842/SP: Reconheceu a possibilidade de usucapião mesmo quando há pendência de tributos sobre o imóvel.
• CNJ – Provimento nº 65/2017: Regulamenta a atuação dos cartórios no procedimento de usucapião extrajudicial.
8. Conclusão
A usucapião extrajudicial é um avanço significativo na desjudicialização da aquisição da propriedade, proporcionando mais eficiência na regularização fundiária. No entanto, sua aplicação ainda enfrenta desafios, principalmente quanto à burocracia cartorária e à resistência de alguns setores.
Para ampliar sua eficácia, é necessário:
• Maior capacitação de advogados, tabeliães e registradores.
• Simplificação dos procedimentos por parte dos cartórios.
• Conscientização da população sobre esse direito.
Com o fortalecimento da usucapião extrajudicial, será possível garantir maior acesso à propriedade formal, promovendo segurança jurídica e desenvolvimento urbano e rural.
9. Referências
• BRASIL. Código Civil de 2002, arts. 1.238 a 1.244.
• BRASIL. Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/1973).
• BRASIL. Código de Processo Civil de 2015, art. 1.071.
• BRASIL. Lei nº 13.465/2017.
• CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Provimento nº 65/2017.